Na condição de Registrador de imóveis, Titular do Registro de Imóveis de Natividade-TO e, atualmente, interventor do Registro de Imóveis de Ponte Alta do Tocantins-TO, temos verificado algumas impropriedades nos procedimentos de retificação administrativa decorrente de certificação geodésica de imóveis rurais (georreferenciamento).
Como sabemos, além dos dados de geolocalização (longitudes, latitudes, altitudes, azimutes e distâncias), a planilha do SIGEF exige informações quanto à confrontação dos imóveis rurais submetidos ao processo de certificação. Os dados relativos à geolocalização são suficientes para o cadastro e para possibilitar que o INCRA possa afirmar, via certificação, a existência ou não de sobreposição com outro imóvel rural já lançado em seu banco de dados.
Entretanto, essa nova descrição do imóvel desencadeia um processo no Registro imobiliário que denominamos de “Retificação Administrativa” ou “Retificação Consensual” do registro do imóvel rural com o fim de promover a atualização da descrição constante da matrícula imobiliária (para saber mais sobre o procedimento, clique aqui).
Noutras palavras, o serviço do cartório não é apenas “averbar o geo” ou “registrar o geo”. Procede-se a uma alteração no registro imobiliário. Essa alteração é regrada no art. 213, da Lei Federal nº 6.015/73 que, basicamente, exige o consenso entre o dono do imóvel retificando e os donos dos imóveis confrontantes.
Eis, portanto, a razão da planilha do SIGEF não se limitar aos dados de geolocalização e exigir, também, os dados dos imóveis confrontantes. A depender da correta disponibilização desses dados nos campos apropriados da planilha do sistema SIGEF/INCRA, a retificação administrativa se tornará um fado grego (se mal instruído) ou uma rotina simples e ágil (se bem informados os dados).
Os campos de imprescindível interesse dos Registradores são:
I – CAMPO CNS, MATRÍCULA E “DESCRITIVO” DA PLANILHA DA CERTIFICAÇÃO:
Esses campos devem vir, SEMPRE, preenchidos com os dados do imóvel confrontante. Isso porque, para que possa ser feito nas vias administrativas, necessário buscar o consentimento dos donos dos imóveis confrontantes e, para tal, deve ser declinado os dados pelos quais se identifica o imóvel confrontante e, com estes dados, possa se notificar seus proprietários.
Portanto, os dados são:
CNS: Que é o Código do Cartório de Registro de Imóveis em que o imóvel vizinho tem registro, este CNS – Código Nacional de Serventias pode ser obtido no seguinte link: www.cnj.jus.br/cartórios.
MATRÍCULA: É o campo em que deve ser, SEMPRE, informado o número da matrícula do Imóvel confrontante. Obs.: Exceção apenas quando o imóvel vizinho for uma área pública e não estiver matriculado em nenhum cartório (vide explicação mais abaixo).
DESCRITIVO: Este campo deve conter, SEMPRE, a denominação do imóvel confrontante. Oportuno dizer que não se deve confundir “dados do imóvel” com os “dados do proprietário do imóvel” confrontante. Exemplo: CORRETO: Fazenda Jatobá (denominação do imóvel); ERRADO: “João da Silva” (Dono da Fazenda Jatobá).
II – DOS ERROS MAIS COMUNS NO PREENCHIMENTO DESSES CAMPOS:
Dito isso, passaremos a listar abaixo os erros mais comuns que temos verificados em nossa vivência no registro imobiliário. Tem sido comum os seguintes erros:
2.1 – Deixar vazio os campos CNS e Matrícula:
Como já dissemos, esses campos podem até não ser relevantes para o cadastro (que é de responsabilidade do INCRA), mas para o registro imobiliário (que é de competência do Registrador de Imóveis) são imprescindíveis para a retificação aconteça nas vias administrativas.
OBSERVAÇÃO: Devemos lembrar que toda e qualquer retificação de registro a ser realizada no Cartório depende do consenso entre as partes (ou seja, entre os donos dos imóveis envolvidos), de modo que se um deles não for ouvido, o ato é nulo, consoante se extrai do art. 213, da Lei de Registros Públicos.
Desse modo, omitido tais dados, a retificação deve ser indeferida pelo Registrador, oportunizando-se, mediante nota de exigências, que se façam as correções que, se não realizadas no prazo assinado, inviabilizam o procedimento retificatório.
Entretanto, surge a pergunta: Mas se o imóvel não tem matrícula em cartório, o que fazer? Este caso é comum quando o imóvel confrontante for: a) Rodovias e (ou) ferrovias não matriculadas; b) Logradouros públicos; c) Cursos e (ou) corpos d’água públicos; d) Terrenos de marinha; e) Terrenos reservados ou terrenos marginais; e f) Terras devolutas.
Inclusive, neste ponto, vale a pena consultar o Manual Técnico de Limites e Confrontações do SIGEF (página 19 desse manual, que pode ser acessado clicando aqui).
Portanto, não sendo uma das exceções acima (áreas públicas ainda não matriculadas), os campos CNS e Matrícula devem ser necessariamente preenchidos.
2.2 – No campo Descritivo, confundir limites naturais (rio, córrego, grota) com confrontante:
Como explicado no item anterior, o campo descritivo é um dos elementos que compõe os dados do imóvel confrontante. Acontece que comumente os credenciados tem confundido esse dados (que seria a denominação do imóvel confrontante) e colocado a denominação do limite natural existente.
OBSERVAÇÃO: Oportuno ressaltar que, a meu ver, esse campo descritivo pode até ficar em branco, desde que o CNS e Matrícula tenham sido informados. Isso porque, com tais dados, restará inequívoca a identificação do imóvel confrontante.
A título ilustrativo, vejam exemplo de preenchimento equivocado:

Vejam, por outro lado, exemplos de preenchimento correto do campo descritivo:
a) Quando o Imóvel vizinho tem CNS, Matrícula e Denominação:

?b) Quando o imóvel vizinho tem CNS, Matrícula e não tem denominação:

c) Quando o imóvel vizinho NÃO tem CNS e nem Matrícula:

?
Resta demonstrado que, se omitidos os dados dos imóveis confrontantes, o processo de retificação administrativa a ser realizado pelo Cartório restará inviabilizado, pois não alcançará o consenso, previsto no art. 213, II, da Lei de Registros Públicos.
2.3 – No campo Descritivo, confundir rio privado com rio público:
Prezados, rio privado (córregos, grotas e outros) são meros acidentes geográficos irrelevantes para o processo de retificação administrativa. Vale dizer que um córrego tem a mesma relevância que uma cerca para o procedimento retificatório. Ou seja, nenhuma relevância. Esse tema é muito bem explicado no Manual Técnico de Limites e Confrontações do SIGEF (vide páginas 12 e 19 desse manual, que pode ser acessado clicando aqui).
Ao registro de imóveis interessa saber, apenas, os dados do imóvel confrontante. Assim:
a) QUANDO FOR RIO PRIVADO: Ou seja, se a divisa do imóvel retificando com outro imóvel vizinho é um córrego ou uma grota, não deve ser feito qualquer referência a este fato no campo Descritivo/Confrontante.
É errado, portanto, o seguinte preenchimento do campo descritivo:

b) QUANDO FOR RIO PÚBLICO: Ou Seja, se a divisa do imóvel retificando com outro imóvel vizinho é um RIO PÚBLICO, o imóvel retificando deve se afastar da margem em 15 metros.(vide art. 14, do Código das Águas)
A propósito, acerca dessa divisão dos Cursos e (ou) corpos d’água, oportuna a lição doutrinária do Registrador paulista Eduardo Augusto, cujos artigos podem ser acessados clicando aqui e aqui.
Para facilitar nossa rápida exposição sobre a identificação dos confrontantes a depender da natureza jurídica dominial do curso d’água, socorrendo-nos das ilustrações constante dos artigos do Dr. Eduardo Augusto, ousamos fazer o seguinte resumo:
TRATANDO-SE DE RIO PRIVADO – Deve ser informado o CNS, matrícula e descritivo do imóvel localizado do outro lado do córrego que serve de divisa e atentar para o fato de que a linha divisória entre os dois imóveis deve figurar no centro do curso d’água (art. 10, § 1º, do Código das Águas), conforme ilustração abaixo:

?TRATANDO-SE DE RIO PÚBLICO – A verificação de ser ou não rio público é, nosso entendimento, do profissional responsável pelo trabalho técnico de agrimensura, devendo mencionar o nome do rio e, por se tratar de terrenos reservados (art. 14, do Código das Águas), afastar-se 15 (quinze) metros da borda (a partir do ponto médio das enchentes ordinárias), conforme ilustração abaixo:

?Note-se que, neste caso, não terá de informar o CNS e nem Matrícula, cabendo apenas, distanciando os 15 (quinze) metros da borda do rio, informar no campo descritivo o nome do Curso ou corpo d’água públicos; Terrenos de marinha; Terrenos reservados ou terrenos marginais; consoante consta do Manual Técnico de Limites e Confrontações do SIGEF (página 19 desse manual, que pode ser acessado clicando aqui).
Por fim, registramos que a idéia deste "post" adveio de uma mensagem, com semelhante conteúdo, que escrevemos e dirigimos aos emails dos Registradores de Imóveis do Estado do Tocantins, aos emails da maioria dos Técnicos credenciados junto ao SIGEF no Tocantins e a alguns dos Servidores do INCRA, em especial ao Dr. Heliomar Vasconcelos, Engenheiro Agrimensor do INCRA/TO e integrante do Comitê Nacional de Certificação, o qual, prontamente, encaminhou-nos manifestação que, dada a sua importância, principalmente porque ratifica o nosso entendimento, transcrevo-a integralmente abaixo:
“Sr Valdiram, Presidente da INOREG
Agradeço em nome do Comitê Nacional de Certificação a oportunidade de fazer alguns informes importantes e também alguns esclarecimentos:
1- Ratificar a informação de que em todas as confrontações tem que preencher o CNS e matricula, salvo nos casos previstos no capitulo 5 do Manual de Limites e Confrontações;
2- Ratificar a informação que o levantamento dos acidentes naturais por água devem seguir as indicações descritas no código das águas, tão bem explicado presidente da INOREG, e salientar aos credenciados que para os afluentes particulares a linha divisória do imóvel deverá coincidir com meio do álveo (meio do córrego);
3- Informar que para a certificação via SIGEF, que define o imóvel pela matricula, o preenchimento apenas do CNS e matricula já seria suficiente para definir o imóvel confrontante, porém, quando os cartórios de registro de imóveis entenderem necessário a complementação das informações do CNS e matricula, o SIGEF está preparado para que o credenciado possa preencher as informações complementares necessárias;
4- Informar que não há exigência de informação de registro de imóvel rural via SIGEF, porém em atendimento a troca mensal de informações entre o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA e os Serviços de Registro de Imóveis, nos termos dos §§ 7º e 8º do artigo 22 da Lei nº 4.947, de 06 de abril de 1966, acrescentados pela Lei nº 10.267 de 28 de agosto de 2001, e dos artigos 4º e 5º do Decreto nº 4.449, de 30 de outubro de 2002, fica muito mais fácil e ágil a interconexão ente INCRA e Cartórios utilizando um meio digital e automático como o SIGEF. Saliento que algumas corregedorias estaduais, como a do Rio de Janeiro e do Rio Grande do Sul, já encaminharam orientações aos cartorários para a utilização do SIGEF;
5- Informar que a ferramenta de retificação está ativa e pode ser utilizada para correção de informações de confrontações, matriculas, detentores, codigos SNCR, dentre outros, não sendo mais necessário o uso do cancelamento para estas retificações;
6- Informar que na ferramenta de registro já está ativa a opção de informar código SNCR do imóvel permitindo a atualização desta informação cadastral;
7- Informar que a validação do código do SNCR também, desde ontem, já está ativa, de forma que o SIGEF verificará se o código declarado é válido;
8- Por fim esclarecer que as analises de informação de registro restringem-se a verificar se todas informações georreferenciadas certificadas constantes do memorial certificado estão na nova certidão de matricula, como também se o numero de matricula, nome de detentores e CPFs são os mesmos das certidões anexas ao requerimento de informação de registro, complementarmente verificamos se algum dado cadastral declaratório informado pelo credenciado no memorial certificado está em desacordo com a Norma, sendo que nestes casos indeferimos o requerimento de registro e informamos aos cartorário que solicite ao proprietário/credenciado que proceda as devidas correções e retificações. Não é permitido a nenhum analista verificar a forma ou legalidade da certidão.
O INCRA/CNC agradece a oportunidade de informar os atuais avanços do sistema de certificação digital e regularização fundiária-SIGEF a um dos principais parceiros na regularização fundiária e consequente na reforma agrária no País, os cartórios de registros de imóveis.
Estamos a disposição para qualquer duvidas e questionamentos.
Heliomar Vasconcelos
Analista em Reforma e Desenvolvimento Agrário.
Engenheiro Agrimensor.
INCRA – SR(26) – Tocantins.”
* O Autor é Registrador do Registro de Imóveis de Natividade-TO, Presidente do Instituto de Estudo e Defesa da Atividade Notarial e Registral do Estado do Tocantins - INOREG-TO.